A tensão hermenêutica em torno do Tema 1214, que aborda a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) no caso de valores percebidos a partir de Planos Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) e Planos Gerador de Benefício Livre (PGBL) após a morte do titular, consubstancia um capítulo complexo da ordem jurídico-constitucional brasileira. Em pauta, está a interpretação do artigo 155, I, da Constituição Federal, responsável por definir a competência dos Estados e do Distrito Federal para a instituição do tributo em questão. Na prática, o cerne da controvérsia repousa na classificação jurídica desses produtos, bem como no enquadramento da hipótese de seu recebimento pelos beneficiários como efetiva transmissão causa mortis.
A batalha conceitual trava-se entre duas naturezas: de um lado, o VGBL, identificado por alguns analistas como seguro de vida com feição de investimento, cujo pagamento, na morte do titular, representaria uma indenização securitária, alheia ao acervo hereditário; de outro, o PGBL, reconhecido como plano de previdência complementar, cujo montante acumulado pelo falecido seria integrado à esfera jurídica dos sucessores, apresentando, portanto, características análogas à herança tradicional.
A dificuldade interpretativa surge exatamente nesse ponto: ao receber esses valores, o beneficiário estaria recebendo um direito próprio, garantido pela lógica securitária, ou ingressando num patrimônio constituído pelo titular, irradiando a ideia de transmissão sucessória?
A relevância alcança patamares nacionais, e a repercussão geral foi reconhecida no RE 1363013, conduzido pelo Ministro Dias Toffoli. Esse recurso tornou-se o epicentro do debate, reunindo argumentos doutrinários e jurisprudenciais. A decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) será um marco, vinculando todos os Tribunais do país e assegurando um critério uniforme à aplicação do ITCMD. De um lado, Estados e Distrito Federal buscam aclarar a possibilidade de taxar tais valores, vislumbrando impactos significativos sobre a arrecadação tributária e sobre o próprio equilíbrio federativo. Do outro, beneficiários, seguradoras e operadores financeiros monitoram o desenrolar do julgamento, antevendo a necessidade de revisões estruturais no planejamento sucessório e previdenciário.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ao declinar pela inconstitucionalidade da cobrança do ITCMD sobre o VGBL e, simultaneamente, afirmar sua constitucionalidade no tocante ao PGBL, lançou luz sobre a diferença entre tais produtos. Essa dicotomia, à primeira vista sutil, remete à essência jurídica de cada plano. O VGBL encontra, na interpretação de certos julgados, um amparo fundamentado no artigo 794 do Código Civil, que assegura à cobertura securitária um caráter de direito autônomo do beneficiário, não integrando a herança. Já o PGBL, delineado sob um prisma de acumulação de capital, equivaleria, na lógica argumentativa de parte da doutrina, a um acervo deixado pelo falecido e, portanto, sujeito à tributação causa mortis.
A imprensa especializada, portais jurídicos e consultores tributários acompanham atentamente o desenrolar dessa análise, trazendo à tona o impacto do entendimento a ser consolidado. Caso o STF venha a estabelecer que o PGBL se equipara à herança, o ITCMD incidirá com efeitos sensíveis na prática sucessória, exigindo dos interessados que repensem a adequação desse produto à sua estratégia patrimonial. Por outro lado, se a Corte confirmar o posicionamento de que o VGBL, por sua natureza securitária, escapa à incidência do tributo, haverá um indicativo claro ao mercado de que esse caminho assegura um instrumento fiscalmente mais vantajoso para a proteção da família no evento morte.
Não se trata, contudo, de simples exercício acadêmico. Os julgamentos do STF, com base no reconhecimento da repercussão geral, têm o condão de promover segurança jurídica em larga escala.
Ao final, o julgamento do STF definirá um referencial legal e interpretativo com força para redesenhar o ambiente do planejamento sucessório.
De um lado, uma eventual incidência do ITCMD sobre o PGBL consolidará a visão segundo a qual esses recursos integram o acervo hereditário, tornando os beneficiários sujeitos à tributação da herança. De outro, a não incidência sobre o VGBL asseguraria uma posição de exceção, fortalecendo a natureza securitária dos valores pagos em razão do falecimento, distanciando-os da tributação, ao menos na forma do ITCMD.
Esse equilíbrio conceitual, dado o grau de tecnicidade envolvido, exige a afinação dos argumentos e a precisão do julgado, elementos aguardados com grande interesse pela comunidade jurídica e econômica.
O julgamento foi iniciado dia 06/12/2024. Aguarde-se.